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Lucrativo negócio de manter a floresta em pé atrai cada vez mais fazendeiros

Mercado de crédito de carbono voluntário deve movimentar US$ 50 bilhões em 2030 e traz oportunidades para o Brasil. Entenda como ele funciona

Por Naiara Bertão — Bujari, Acre

21/09/2022 04h31  Atualizado há 4 horas

A velocidade com que a Floresta Amazônica é derrubada é algo que impressiona leigos e especialistas. De janeiro a agosto, já foram quase 8.000 quilômetros quadrados de clarões, o pior número em 15 anos, de acordo com o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia. .

Ameaças como essas são vistas diariamente em propriedades públicas e privadas na região. Em 2018, a Fazenda Bella Aliança, no município de Bujari, a 25 quilômetros de Rio Branco (Acre), foi invadida. Em 2019, outra área próxima, a Fazenda Ipanema, também foi alvo de desmatamento ilegal para extração de madeira.

Os fatos foram um sinal para que o empresário e pecuarista Ricardo Gontijo, dono das duas propriedades, decidisse tirar do papel um plano que poderia proteger ainda mais a reserva florestal: gerar créditos de carbono.

— Hás três anos ouço que a preservação da natureza, floresta e biodiversidade é a palavra da vez — diz seu Ricardo, como é conhecido na região.

Desde que chegou à região ele já decidiu manter as árvores em pé, pois, dessa forma, em sua visão, garantiria, sombra para o gado, terra mais fértil e dinheiro a mais na conta.

— Acredito que a mata vai valer mais do que a fazenda. O mundo vai pagar cada vez mais pela sustentabilidade. Quero comprar mais terras para gerar ainda mais créditos.

Hoje, um crédito de carbono, que equivale a uma tonelada de dióxido de carbono cuja emissão é evitada, está sendo negociado no mercado voluntário brasileiro entre US$ 10 e US$ 12. Na Europa, já é comercializado a US$ 15.

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De acordo com o Ecossystem Marketplace, o mercado voluntário de créditos de carbono chegou a quase US$ 2 bilhões no mundo em 2021. A estimativa da consultoria McKinsey é que esse mercado atinja US$ 50 bilhões em 2030. O Brasil possui 15% do potencial global de geração de créditos por soluções naturais, incluindo restauração florestal, projetos de preservação de florestas, entre outros

>— O país tem vocação natural para créditos voluntários florestais. Além do benefício associado à redução de carbono na atmosfera, há benefícios adicionais, como proteção da biodiversidade, melhora da segurança hídrica e desenvolvimento socioeconômico — diz Henrique Ceotto, sócio da McKinsey.

Certificação

No Brasil, 77% das 80 principais empresas já anunciaram metas de redução de emissões, e parte importante da estratégia será a compensação por meio de compra de créditos. É essa a aposta do seu Ricardo. Considerando que a abertura de mata para agropecuária é responsável por mais de três quartos do desmatamento, segundo o MapBiomas, criar estratégias para convencer o setor a manter a floresta em pé é imprescindível.

A lógica é simples: ao se proteger uma área que provavelmente seria derrubada no futuro, garante-se que aquele pedaço continuará absorvendo e fixando gás carbônico da atmosfera, prevenindo o agravamento do aquecimento global. Quem investe nisso é compensado com certificados que equivalem a emissões de carbono evitadas e que, então, são vendidas.

Apesar de parecer fácil, o desenvolvimento de um projeto de Redução de Emissões provenientes de Desmatamento e Degradação Florestal, os chamados REDD+, que focam em florestas nativas, pode levar anos.

O HIWI, por exemplo, começou oficialmente em agosto de 2019 e recebeu só em agosto deste ano a primeira auditoria da certificadora Verra, o último passo para validar a geração. Está prevista a proteção de 20,5 mil hectares de floresta amazônica durante 30 anos, período em que, espera-se, serão evitados 5.161 hectares de desmatamento, equivalente a 2,64 milhões de toneladas de CO2.

O que pouca gente sabe é que nem toda área verde pode gerar créditos. A viabilidade para se ter um projeto é haver risco de desmatamento. Se não existir ameaça, não há potencial de geração, explica Felipe Viana Lima, diretor comercial da Carbonext.

Para verificar se há ameaça ao território, é analisado o histórico da área em volta da fazenda por meio de imagens de satélites e é usado um softwares para medir a probabilidade do avanço dos clarões nas décadas seguintes. A partir daí, é possível provar que a área está sujeita ao desmatamento e traçar estratégias de contenção.

Engajamento das comunidades é crucial

Os projetos de geração de créditos de carbono estão alinhando a preservação ambiental com o impacto social. Em terras públicas com comunidades indígenas e quilombolas, os processos para conseguir o aval de certificadoras internacionais exigem ritos de engajamento e aprovação conjunta de ações. Sem isso, nada de crédito.

— Quando há ações sociais, os créditos gerados são do tipo CCB (clima, comunidade e biodiversidade), que são mais caros. Eles são também preferidos pelo mercado, porque a ideia é que esses créditos conseguem gerar uma preservação de mais longo prazo — explica Felipe Viana Lima, diretor comercial da Carbonext.

Considerando que para viabilizar uma geração de carbono é preciso ter milhares de hectares, o que só quem tem dinheiro consegue, cuidar de quem não tem a mesma oportunidade é visto como uma ação de responsabilidade social. Além disso, há uma lógica financeira por trás: engajar as comunidades é imprescindível para manter a floresta em pé e garantir os créditos de carbono.

Renda é principal entrave

Segundo Francy Nava, gerente de projetos REDD+ na Carbonext, durante a prospecção e análise de viabilidade de um projeto, uma equipe vai a campo identificar os agentes do desmatamento — que pode incluir comunidades — e as fragilidades socioeconômicas de quem vive no raio de 20 quilômetros.

No HIWI REDD+, administrado pela Carbonext e que engloba quatro fazendas em Bujari (Acre), nos dois anos de desenvolvimento foram feitas visitas a moradores para explicar o que é geração de carbono e anotar as necessidades da região. Até agora, 158 pessoas tiveram acesso à prevenção na saúde, 59 passaram por treinamentos e cinco comprovadamente tiveram aumento de renda. A renda é o calcanhar de Aquiles.

No Projeto de Assentamento Dom Moacir, uma das 18 contempladas pelo HIWI, a produção de verduras é pequena e os custos para manter o solo fértil e longe de pragas só cresce. Além disso, na hora de vender a mercados da região, os moradores concorrem com atravessadores, que compram de diversos locais e garantem volumes maiores. A descrença com relação a promessas feitas por empresários e políticos no passado confere um desafio extra ao time do HIWI.

Projetos que são bem-sucedidos neste tipo de engajamento ainda são minoria. Como demoram mais tempo para ficarem de pé e são mais complexos, a oferta também ainda é baixa. Mas há demanda por eles:

— A busca por cobenefícios socioambientais é uma tendência. Há iniciativas que demonstram a crescente preocupação de empresas com aspectos sociais no desenvolvimento de projetos de carbono — diz Laura Albuquerque, gerente de consultoria da WayCarbon, ao citar o estudo Oportunidades para o Brasil em mercados de carbono em 2021.

*A jornalista viajou a convite da Carbonext

Fonte:  Naiara Bertão — Bujari, Acre

https://oglobo.globo.com/economia/esg/noticia/2022/09/o-lucrativo-negocio-de-manter-a-floresta-em-pe-atrai-cada-vez-mais-fazendeiros.ghtml?utm_source=globo.com&utm_medium=oglobo