Mariana Goldfarb fala de seu podcast e das vezes que sofreu assédio sexual: ‘Isso não vai embora’
Por Anna Luiza Santiago
26/01/2023 06h55 Atualizado há uma hora
Mariana Goldfarb acaba de encerrar a primeira temporada de seu podcast “C/Alma” e já mira na segunda leva de episódios:
— As pessoas pediram muito e, desta vez, vai ser tudo filmado, para que todos possam assistir à conversa. Além do Spotify, será possível encontrar no YouTube. Acho que isso aproxima o público. Vou gravar em fevereiro. Agora, acho que tenho mais estofo, mais bagagem. Foi minha primeira experiência conduzindo um podcast. Então, acho que estou cada vez mais apta, mais alerta do que que é legal falar e do que não é e mais confortável para receber as pessoas.
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Mariana conversou com nomes como a cantora Jojo Todynho, a influenciadora Camila Coutinho e a advogada e apresentadora Gabriela Prioli. Entre os temas, assédio sexual, maternidade, pressão estética distúrbios alimentares e autoestima. Ela explica como será daqui para frente:
— Na segunda temporada, quero trazer nomes conhecidos, mas também os que não são. Pretendo conversar com mestres de suas áreas, para ampliar o diálogo. Pessoas de outras áreas, que possam agregar. Acho que os assuntos de que falamos têm que ter tratados muitas vezes. É bater na tecla, sim. Falar sobre racismo, preconceito em todos os níveis… Temos que falar sobre coisas que incomodam. Justamente porque incomodam devem ser tratadas. Não tenho nenhuma vontade de falar de assuntos doces, de ser superficial em nenhum tema. Quero expurgar coisas que a gente guarda, sobre as quais às vezes não tem com quem conversar e que nos sentimos culpadas por sentir. Mais pelo universo feminino mesmo. Não tenho o desejo de convidar homens ainda, mas isso é passível de mudança, até porque acho que a gente tem que incluir o olhar masculino, é muito importante. Sou a favor, mas creio que ainda precisamos focar na mulher.
Esse processo de externalizar dores, traumas, raivas e incertezas aconteceu com Mariana em todos os episódios. Um dos mais marcantes foi o de Camila Coutinho, em que ambas relataram assédios. Mariana contou que, ao provar roupa numa loja de um shopping de luxo, teve as partes íntimas tocadas pelo vendedor:
— (A conversa) Me fez chorar pra caramba. São temas comuns a todas nós, vamos nos curando juntas. Me fez muito bem, porque senti que não estava sozinha. Por mais que a gente veja, infelizmente, esse tipo de notícia o tempo todo, ter alguém ali também disposta a abrir uma coisa tão delicada num podcast é muito forte. Me deu vontade de me aprofundar no assunto. Eu trato esse tema com frequência na terapia. Para quem sofreu abuso, isso não vai embora. Você convive com aquilo, com medo, com culpa. E se eu tivesse agido de outra forma? E se tivesse denunciado, ido à polícia? E se eu tivesse feito alguma coisa? Por que eu não fiz nada? Será que estava com uma roupa inadequada? Esse pensamento machista, né? Será que fiz alguma coisa que deu a entender que o cara podia fazer isso? São pensamentos que passam na cabeça das mulheres. Justamente falando sobre isso que a gente fala assim: “Não, eu não fiz nada errado, não estava inadequada”. Eu só estava dentro do provador experimentando a roupa que ia comprar. Só falando quantas vezes forem necessárias a gente consegue se livrar dessas culpas.
Mariana conta que já havia passado por outras situações como essa:
— Já rolaram várias vezes. A última vez que rolou muito forte tem cinco anos, que foi nessa loja. Aconteceu no meio do horário comercial. Nunca mais voltei ao shopping nem me lembro do rosto da pessoa. Se eu voltasse a essa loja, não conseguiria identificar o rosto dele. Foi apagado da minha memória. Antes já tinha acontecido em local de trabalho inúmeras vezes. Modelo tem muito pouco valor, é uma profissão pouco respeitada. E na época eu trabalhava muito como modelo. Na verdade nem é a profissão. As mulheres de maneira geral são desrespeitadas. Depois desta vez do shopping, eu andei tão escaldada… Eu sei lá, ando com medo, não deixo muito se aproximarem. Não denunciei esse cara nem do trabalho. Poderia ter. Às vezes me sinto muito irresponsável, porque o que esse cara fez comigo… Eu não fui a primeira. Eu procuro ferramentas que me botem para agir, que me botem para denunciar um cara desse. A gente tem medo de denunciar um cara que abusou da gente. Eu ainda estou entendendo o porquê. Que medo é esse? Acho que a gente tem que investigar esse medo, entender de onde ele surge. Quando eu me sentir preparada, eu vou (denunciar). Esse homem da loja não tenho como, porque não sei o nome dele, não me lembro nada, não sei nada. Fiquei completamente paralisada. Mas do trabalho eu posso denunciar ainda. É uma em coisa que venho trabalhando, juntamente com minha analista, para conseguir fazer isso de uma maneira correta e consciente, mas para fazer. Queria poder te falar assim: “É esta pessoa aqui, nome, sobrenome, CPF e tal”. Mas não consigo fazer isso ainda.
É na terapia também que Mariana trata do peso de lidar com a exposição, sendo uma modelo de sucesso e casada com o ator Cauã Reymond. Diariamente, ela recebe diversos comentários em suas redes sociais, sejam ataques à aparência e às opiniões ou observações não solicitadas sobre o relacionamento. Mariana conta que é difícil ignorar tudo:
— Não tenho maturidade ainda. Às vezes consigo. Falo: “Ah, deixa isso pra lá”. Mas sou humana, não sou um buda. Tem vezes que me magoa. Quando falam da minha índole e do meu caráter, às vezes não consigo relevar. Eu não acho que a pessoa, porque existe rede social, pode falar o que quer. Isso não existe. Está errado. Me atinge. Tem vezes que consigo fazer a Cleópatra e genuinamente não ligar. Isso tem acontecido mais. Mas se a pessoa fala algo e não estou num dia bom, estou frágil, aí dou uma resposta. Eu, hein (risos).
Aconteceu recentemente, quando uma pessoa escreveu: “O cabelo da Grazi é mais bonito que o seu”, referindo-se a Grazi Massafera, ex-mulher de Cauã. Mariana respondeu, rechaçando qualquer rivalidade: “Ai, também acho. O cabelo dela é lindo! E eu tenho a chance, a oportunidade de ver pessoalmente. Sempre e é aquele cabelo, mesmo”. Ela explica:
— O pior é que são mulheres que estão adormecidas para caramba, que ainda não despertaram para elas próprias. É um chamadão. Sabe aquele constrangimento educativo? É assim. Você tem que falar. Não que a pessoa vá se situar, é uma escolha de cada um. Mas, por exemplo, quando alguém faz piada racista, tem que haver constrangimento, senão ela não vai parar. Tem que educar, no bêabá.
Fonte: Anna Luiza Santiago