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Que em 2026 o Brasil seja mais brasileiro

Apenas críticas não apontarão caminhos para o futuro. A recuperação da essência não significará abandonar a modernidade

Por Maurício Noriega — Doha, Catar

10/12/2022  Atualizado há 2 horas

A Copa de 2022 é história para o Brasil. Muitas críticas serão feitas. Fato é que seguimos empacados nas quartas de final (recuso-me a citar 2014 por razões óbvias). A campanha opaca no Catar, com duas vitórias, um empate e uma derrota no tempo normal reflete o contexto atual. O Brasil para em qualquer adversário europeu que enfrenta numa Copa desde 2002.

Recentemente foi publicado um texto do treinador espanhol Juan Manuel Lillo Diéz, considerado um dos gurus de Pep Guardiola, no qual ele afirma que o futebol acabou. O que ele quer dizer é que houve um processo de pasteurização do jogo, que parece estar sendo jogado no modo linha de produção mundo afora.

Há alguns anos tenho afirmado que as escolas de futebol estão acabando. Não existem mais os estilos facilmente identificáveis, o jeito argentino, a arte brasileira, a estratégia alemã, o chuveirinho inglês. A seleção brasileira que disputou a Copa do Catar talvez passasse por outra nacionalidade sem espanto se outra camisa vestisse.

Esse processo de doutrinação, provocado pela globalização e pelo crescimento econômico-esportivo dos grandes clubes europeus, pode ser considerado bom ou ruim. Vai do gosto do cliente. Mas penso que o Brasil é quem mais perde com isso. Nosso futebol pode ter sido melhor ou pior em determinadas épocas, porém, foi sempre diferente. Assim encantou o mundo e espalhou a mística do jogo bonito.

Ah, você é um dinossauro! Saudosista! Ultrapassado.

Direito de quem me dá a honra de ler esse texto pensar o que quiser.

Eu penso que houve um estilo brasileiro de se jogar futebol que está sendo apagado e substituído por algo mais controlado, emoldurado em termos enciclopédicos que apenas substituem as mesmas situações de sempre por algo mais erudito e empolado.

Sempre houve times organizados e bem montados taticamente no Brasil. Mas sempre houve algo que todos os rivais invejavam: a centelha, a fagulha, a imprevisibilidade, os dribles, as jogadas impossíveis (para os outros) que só os brasileiros sabiam fazer.

Recuperar isso é um trabalho difícil e que precisa ser feito em longo prazo, envolvendo o futebol brasileiro como um todo, desde a base dos clubes até a maneira como se transmite e se torce no futebol nacional. Organizar um time, ensinar jogadores a se movimentar, criar sistemas de jogo e esquemas táticos, tudo isso sempre foi feito no Brasil. A Seleção de 1970 foi uma aula de sistema de jogo e tática voltados à exploração máxima das capacidades individuais dos atletas – principalmente dos mais talentosos.

O Brasil jogou um bom segundo tempo contra a Croácia, mas será que em algum momento impôs seu estilo? Ou estrategicamente os croatas conseguiram fazer o que se adaptava ao estilo de seus atletas, um jogo com toque de bola lento para dosar o ritmo?

Quantos dribles os atletas brasileiros executaram? Quantas vezes os laterais brasileiros fizeram jogadas de ultrapassagem e foram até o fundo? Na única tabela que foi realizada (algo que era trivial em qualquer domingo nos estádios brasileiros), saiu o gol brasileiro. Um belíssimo gol do único craque brasileiro em atividade, ainda que jogando muito abaixo do que poderia.

A evolução do jogo, a troca constante de informações, a atualização de métodos e conceitos, tudo isso é importante, necessário. A redução de espaços nunca impediu que os grandes talentos brilhassem. Estão aí Messi, Cristiano Ronaldo, que são os expoentes de uma geração que enfrentou isso, e Mbappé, provavelmente o grande craque dos próximos anos.

Enquanto estiver aprisionado na padronização de estilos e estratégias, supervalorizando questões táticas em detrimento da formação técnica e individual de excelência dos seus atletas, o futebol brasileiro seguirá em dificuldades quando enfrentar adversários importantes. Lembremos que os croatas são os atuais vice-campeões mundiais e alcançaram as semifinais.

Fonte: Maurício Noriega — Doha, Catar

https://ge.globo.com/blogs/papo-cabeca-com-mauricio-noriega/noticia/2022/12/09/que-em-2026-o-brasil-seja-mais-brasileiro.ghtml