Nos últimos 12 anos, governos de SP investiram 62% da verba aprovada para prevenção de desastres naturais
Entre 2011 e 2022, governo estadual sempre executou valores abaixo daqueles aprovados pela Alesp para a área de Infraestrutura Hídrica e Combate a Enchentes, que incluem situações como a ocorrida no desastre do Litoral Norte do estado.
Por Léo Arcoverde, GloboNews
23/02/2023 04h00 Atualizado há 4 minutos
Governadores responsáveis por administrar o estado de São Paulo entre 2011 e 2022 deixaram de investir 38% do valor previsto no orçamento público para prevenção de desastres naturais no estado.
Com R$ 10,4 bilhões destinados ao tema, os governos investiram R$ 6,4 bilhões — 62% do total. É o que aponta levantamento feito pela GloboNews com base na Execução Orçamentária, disponibilizada pela Secretaria Estadual da Fazenda e Planejamento.
Os recursos previstos serviriam para obras e ações para evitar tragédias como a ocorrida no Litoral Norte de São Paulo, no último fim de semana. Com mais de 600 milímetros de chuva, a região teve pontos de enchente que cobriram casas e deslizamentos em áreas residenciais e em estradas. Até o último balanço, 48 pessoas morreram e dezenas estão desaparecidas.
Neste período, o estado foi governado por Geraldo Alckmin (PSDB, hoje no PSB), Márcio França (PSB), João Doria (PSDB) e Rodrigo Garcia (PSDB). Hoje, o governador é Tarcísio de Freitas (Republicanos), empossado em 1º de janeiro de 2023, mas não entra nessa contabilidade dos últimos 12 anos.
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A Secretaria Estadual da Fazenda e Planejamento disponibiliza dados da execução orçamentária – tanto receita (arrecadação) quanto despesa (gasto) – de 2010 para cá (confira na arte abaixo). A atualização é feita até o dia anterior ao da consulta. A reportagem analisou os números da rubrica — item orçamentário — denominada Infraestrutura Hídrica e Combate a Enchentes, que inclui também a prevenção a desastres naturais.
Ao longo de 13 anos completos, apenas em um deles (2010, ano eleitoral) o valor investido nesta área superou o total aprovado pelo Legislativo: foram gastos R$ 282,5 milhões de uma verba prevista inicialmente de R$ 200,6 milhões. Os valores para consulta são totais (não atualizados pela inflação do período).
A GloboNews procurou os governos passados para falarem sobre a execução menor de gastos (leia mais abaixo).
Para 2022, a verba aprovada para Infraestrutura Hídrica e Combate a Enchentes foi de R$ 1,99 bilhão, valor recorde.
Consulta realizada na quarta-feira (22) indica que o governo do estado investiu, de fato, R$ 1,72 bilhão. Isso quer dizer que pouco mais de R$ 271 milhões deixaram de ser investidos em ações como implantação de sistemas de drenagem, manutenção e construção de reservatórios de contenção e transferências de recursos a municípios no setor de recursos hídricos. Se comparado à execução deste orçamento em anos anteriores, o percentual utilizado do total aprovado foi mais alto: 86%.
A Defesa Civil estadual disse, em nota, que “nos últimos 4 anos investiu cerca de R$ 109 milhões em obras de prevenção e recuperação de pontes, escadas hidráulicas e muros de contenção de encosta”.
Para Pedro Luiz Côrtes, professor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP, é uma “falta de consideração” do governo não aplicar toda a verba prevista para evitar eventos recorrentes.
“Isso demonstra uma falta muito grande de atenção por parte do governo em relação a esses eventos climáticos. Não é de hoje que nós sofremos enchentes, alagamentos, inundações, deslizamentos de encostas em São Paulo, na região metropolitana e em diversos municípios. Essa situação vem se agravando com as mudanças climáticas e o que a gente vê por parte dos políticos é uma falta de consideração, uma falta de atenção, para esse tipo de evento. Ou seja, é um descaso muito grande para o que vem acontecendo ao longo dos últimos anos.”
Segundo Côrtes, a falta de empenho em aprimorar as ações de combate às enchentes não se resume a uma determinada gestão de governo.
“Eu costumo dizer: ‘você quer deixar um político apavorado? Pergunta quais os planos que eles têm em relação aos eventos naturais extremos e às mudanças climáticas. Boa parte dos políticos sequer saberá sobre o que nós estamos falando. Há uma falta de conhecimento, há uma falta de atenção. E veja, eles têm totais condições de buscar informação qualificada, tem assessoria para isso. Mas, efetivamente, há um descaso, é uma desconsideração com o que vem acontecendo, não há outra explicação para isso”.
“As verbas estão disponíveis, mas é um orçamento que não é executado e isso é muito difícil de entender diante, inclusive, das mortes que vem acontecendo face a esses eventos extremos.”
O que dizem os governos
A reportagem questionou a assessoria de imprensa do ex-governador João Doria, que se desfiliou do PSDB em outubro de 2022 após 22 anos no partido para obter uma resposta a execução orçamentária no combate a enchentes entre 2019 e 2022, mas não obteve resposta.
Em janeiro de 2021, a GloboNews fez um levantamento parecido com dados relativos ao período 2011-2021. E obteve respostas das gestões dos ex-governadores Geraldo Alckmin e Márcio França.
Veja a nota do ex-governador Márcio França:
“Márcio França ficou no cargo por oito meses, com as restrições legais de gastos de ano eleitoral, e com planejamento feito pelos governos anteriores. Estas obras de drenagem precisam sempre ser licitadas e aprovadas com muita antecedência. Por isso, França quer ser governador por quatro anos, para desatar nós que o Doria, com todo seu marketing, não conseguiu desatar.”
A assessoria do ex-governador Geraldo Alckmin informou que, durante os anos de 2015 e 2016, a verba destinada a essa área foi utilizada para atenuar os impactos da crise hídrica que castigou a região metropolitana de São Paulo.
Procurada, a gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) disse em nota que “o governo de SP realiza medidas complementares às municipais para auxiliar na drenagem urbana e combate às inundações. No último ano foi investido cerca de R$ 1,151 bilhão em ações e obras para combate a enchentes. Em 2023, o orçamento estimado é de aproximadamente de R$ 1,213 bilhão.”
Fonte: Léo Arcoverde, GloboNews