Butantan pode ter vacina trivalente contra Covid, mas falta interesse e planejamento no atual governo, diz Dimas Covas
Os imunizantes adaptados já foram criados pela farmacêutica SinoVac, testados na China e estão em teste no Chile. Vacinas bivalentes e trivalentes da CoronaVac já demonstraram resultados superiores aos da original, entretanto, não há sinalização de interesse por parte do Ministério da Saúde.
Por Lucas Machado, Globo News
25/11/2022 07h32 Atualizado há 2 horas
O Instituto Butantan afirmou nesta quinta-feira, 24, em entrevista exclusiva à GloboNews, que já está pronto para produzir a vacina adaptada com as novas cepas do SarsCov-2, mas que só vai iniciar os estudos e entrar com o processo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pedindo autorização para uso emergencial do novo imunizante, se o Ministério da Saúde demonstrar interesse em comprar a CoronaVac.
A afirmação foi feita pelo presidente do Butantan, médico e professor na Universidade de São Paulo (USP), Dimas Covas. Segundo ele, já existem duas atualizações da CoronaVac, elaboradas pela empresa farmacêutica SinoVac.
“Uma atualização é bivalente, incluindo as cepas BA1 e BA5, e, existe também uma vacina trivalente, constituída pela variante original; a variante Delta, e a subvariante BA5, da Ômicron. Elas já foram testadas na China e a trivalente está sendo testada no Chile, em esquema de dose adicional. Nós só não avançamos nisso porque não houve, por parte do Ministério da Saúde, nenhuma sinalização”, explicou Dimas.
O presidente esclarece que, não é possível desenvolver as novas versões no Brasil se não houver interesse na aquisição das vacinas por parte da autoridade responsável pelo Programa Nacional de Imunização.
“Para o Butantan, a incorporação disso é muito rápida, mas para isso acontecer, é preciso ter o mercado. Nesse momento nós não temos o mercado definido, que é o Ministério da Saúde. Mesmo com relação à bivalente da Pfizer, ainda não houve uma manifestação clara do Ministério da Saúde, a divulgação de um cronograma de vacinação com relação à Covid, então nós não temos condições de avaliar como será 2023”.
Dimas ressalta que o SarsCov-2 é um vírus que vai continuar circulando, e que mesmo com a vacinação não será eliminado de circulação nos próximos anos.
“Nós estamos em uma situação muito parecida com a que ocorre com a gripe, em que todo ano há a necessidade de uma vacinação com uma vacina adaptada. É preciso que haja um planejamento, o que não houve, por parte do Ministério da Saúde. Sabemos que o novo governo já iniciou movimentos nesse sentido, se reunindo com especialistas, para prever o esquema vacinal para 2023”, disse.
Os estudos com as vacinas bivalentes e trivalentes, na China, começaram há cerca de seis meses. E, em breve, conforme afirmou o professor Dimas, sairão os resultados da trivalente no Chile.
“A adaptação é um procedimento relativamente simples. Visto que, são culturas de vírus. Você isola o vírus da população e leva a ser cultivado em laboratório. Obviamente que, nós precisamos submeter o dossiê de autorização à Anvisa, mas isso ainda não foi feito exatamente porque não temos demanda”, disse.
Uma vez submetido o pedido, a Anvisa tem um prazo para se manifestar, no caso do exemplo recente da Pfizer, de quase três meses, mas que pode variar.
Questionado sobre os resultados das vacinas adaptadas, o professor Dimas disse que “as vacinas já demonstram respostas não só contra as outras partes do vírus, mas especificamente contra a proteína da variante Ômicron, que é a que circula nesse momento. Ela é mais ampla na sua resposta imune, e parte daí a sua grande utilidade. As bivalentes e trivalentes da CoronaVac têm desempenho, no sentido de indução de resposta imune, superior a vacina inicial”.
O Instituto Butantan afirma que os estudos no Brasil já estão sendo planejados e, ainda que sem sinalização do Ministério da Saúde, a expectativa é que as vacinas adaptadas da CoronaVac cheguem ao país no primeiro trimestre de 2023.
Em 2020, o presidente Jair Bolsonaro desautorizou a compra da CoronaVac e depois recuou. Ele dizia que ninguém estava interessado no imunizante.
Bolsonaro também chegou a dizer, em discurso na época, que já havia mandado cancelar o protocolo de intenções de compra de 46 milhões de doses da vacina CoronaVac, e ignorou ofícios em que o Instituto Butantan oferecia doses da vacina.
“O que precisa ter é uma mudança de postura em relação a CoronaVac, que foi combatida diretamente pelo governo federal desde o lançamento. É preciso que haja mudança de postura, para que as pessoas enxerguem a CoronaVac como uma vacina produzida por um instituto nacional, de importância no mundo, como é o Butantan, décimo produtor de vacinas no mundo todo. A CoronaVac é utilizada em mais de 50 países”, explicou Dimas.
O planejamento do Butantan é iniciar os estudos, ainda sem prazo, no município de Serrana, no interior paulista, onde já foi realizado o Projeto S, que demonstrou 80,5% de eficácia contra casos de Covid-19 e de 94,9% contra mortes. A cidade tem cerca de 40 mil habitantes e todos os moradores foram vacinados com o esquema primário.
“Estamos planejando a introdução da vacina trivalente na população, e o investimento será em um esquema de vacinação ‘booster’, como quarta ou quinta dose. Podemos conduzir os estudos, desde que haja sinalização da utilização da vacina. O Butantan tem a sua fábrica para a produção em condição de operar. É preciso discutir qual será a estratégia brasileira das vacinas de Covid. Se serão uma ou duas campanhas. Não temos sequer discussões no âmbito do Ministério”, explicou Dimas.
Fonte: Lucas Machado, Globo News